segunda-feira, dezembro 27, 2010


Meu mundo ilustrado



Paper clips and crayons in my bed
Everybody thinks that I'm sad
I'll take a ride in melodies and bees and birds
Will hear my words
Janta – Marcelo C
amelo


Com aquela mesma flauta que eu vou tocando a vida, vou desenhando um caminho de notas musicais pra ver se tudo fica mais doce. Igual ao sol que eu costumo arranhar no violão nos dias nublados que é pra ver se as coisas passam a clarear.

Me apeguei nas cantigas de roda, no verso tímido, no reza sem jeito, no sorriso solto e no abraço apertado. Me refiz aos goles e hoje já sinto aquele gosto de sonho recém colocado na vitrine pela confeiteira. Joguei todas minhas fichas na fonte encantada apostando com fé que as coisas poderiam dar jeito.

Deve ser porque eu tenho esses dois olhões para o que é pequeno e porque me apego rápido às coisas simples que deixam a gente de riso solto, fala mansa... feliz fácil, fácil.

Deito na grama inventada, admiro as cores do arco-íris desenhado pela mocinha que ainda não sabia desenhar muito bem, observo o balão colorido que vai subindo, subindo em direção ao sol numa garoa mansa de fim de tarde.

Ilustro algumas bolhas de sabão que acabaram de sair do canudo que é pra acompanhar, me prendo a elas com a mesma linha do carretel do menino da pipa, e vou subindo em direção as nuvens que vão formando desenhos geométricos.

Com os olhos repletos de sorrisos e os braços carregados das esperanças, subia, subia, não para atingir o pico mais alto, quebrar os recordes e correntes que me aprisionavam, mas sim para continuar subindo para o infinito e além. Não sentido dor, nem fome, nem cansaço, nem peso,nem nada. Sentia leve, sentia pluma, sentia pluma ao vento, sentia o vento que levou a folha, desmanchou meu castelo nas férias da praia, aquele mesmo que transformou tudo em reticências.

Se a bolha estourar, me penduro na linha da letra garranjo do menino da pipa, me apoio na interrogação, me escondo na entrelinha, viajo no sentimento aclamado da exclamação. Só me desfaço e me esborracho no rasgo, no vinho sobre o papel ou no farelo da borracha.



quinta-feira, dezembro 16, 2010


Bolha de sabão ou Aquilo que se desmancha no ar

'Mas a gente vai à luta e inventa um novo sonho, uma esperança, mesmo recauchutada: vale tudo menos chorar tempo demais. Pois sempre há coisas boas para pensar. Algumas se realizam. Criança sabe disso.'
Lya Luft

Amanhã quando o sol der seu show, provavelmente você não vai mais me encontrar por aqui.

Deve ser porque só sei brilhar no escuro, enquanto todo mundo dorme, enquanto gente pequena conta carneirinho, enquanto alguém olha pra cima... enquanto as fábricas fumam descontroladas junto com os insones e com quem ainda não parou pra deitar os olhos.

Sei de cór o ronco dos motores que cortam sem dó as avenidas solitárias e as palavras de fé das senhoras que, acompanhadas do tercinho de pérolas enrolados entre os dedos, pedem paz, saúde, chuva ou sono. As canções de amor dos românticos que esperam na ou embaixo da janela me embalam e impulsionam a brilhar pra encantar quem ainda acredita numa noite azul de lua cheia e céu estrelado.

Nem que me pedissem eu não deixaria a história nem a escreveria novamente. Não sou o protagonista da noite, mas faço dela meu conto principal. Já que o sono não veio menina, eu te acompanho, continue pintando a vida, não tem problema se a tinta ultrapassar o contorno, continue tentando, você pode inventar uma nova tendência de colorir, repouse os olhos, o céu sempre permite condições de vôo, mas só se for pra ir bem alto, então, pegue impulso.

Você pode ser bem pequenininha é só bater os pés para flutuar; ter mil asas. Ser bailarina, cantora, mágica ou equilibrista, basta um estalar de dedos e num estante você chega até mim. Ilumino todo o caminho enquanto passeamos por toda a via-láctea, a gente pode chegar nos portões dos planetas e chamar pra brincar. Não vai precisar ficar de castigo, perguntar se está perdoado, tomar sorvete só depois do almoço e sair pra brincar na chuva. A gente pode desenhar um coração bem grande e colocar tudo o que a gente mais quer e mais gosta dentro. Colocar todo o pozinho reluzente do ‘tudo pode acontecer’ dentro de um pote de doce de leite da vovô e passar uma fita rosa em volta como se fosse presente....

Com o vapor da nossa respiração é como se o vidro fosse ficando um pouco embaçado e...

Amanhã ao abrir seus olhos, feito bolha de sabão que se desmancha no ar, provavelmente você não vai mais me encontrar por aqui e certamente não se recordará de mim, mas terá a certeza que o melhor do sonho é sonhar.


sexta-feira, dezembro 10, 2010


Baile de máscaras


Só porque a Colombina enfeitou meu carnaval...


Toda terça-feira de carnaval o bloco sai à rua. E as ruas que um dia sem sentido foram desertas se enchem de cores, serpentinas, confetes e marchinhas alegres que a moçada vai cantando em coro com ornamentos e rostos pintados.

A magia toma conta da cidade que até parece que esqueceu dos farrapos e das arquibancadas desertas. Fadas, colombinas, arlequins, piratas, o rei momo, ciganas e bruxas desfilam se misturando em meio a leões, tigres e algumas fantasias inomináveis.

Allah-lá-ô, ô ô ô ô ô ô, dava para ouvir a alegria dos foliões e a felicidade estampada nos olhos por trás de toda maquiagem, às vezes escondidos por máscaras, porém felizes. É como se todos esperassem o carnaval chegar para espantarem seus medos, seus receios, seus pudores, liberarem suas fantasias.

A colombina está sozinha no bloco, apaixonada pelo pierrot que não gosta muito de sair de casa, sendo paquerada pelo arlequim toda astuto que a observa, calado, de canto de olhos.

Como quem sabe que carnaval é nuvem que passa, ela dançava ao som da marchinha de fora, no ritmo da música que batia por dentro. Fechava os olhos e lançava-se no sonho da magia do carnaval de fazer tudo virar pó de pirilimpimpim, na chuva de confetes, encantos e festins de serpentinas coloridas. Bailando em um campo de girassóis, respirando o perfume doce do jasmim, num movimento suave de mãos e pés rodopiantes, similar a alguém que não vai parar tão cedo, e nem quer que a meia-noite chegue logo.

Mesmo que a vida seja pesada e lhe doa por dentro ela continua hipnotizando quem vê suas cores cintilantes reluzentes, com sorriso de estrela e delicadeza de pluma, borboletando suas asas diante dos olhos do arlequim apaixonado e de quem acompanha o bloco passar.

Ela vira a esquina e se vai levando seu brilho e suas cores.

Amanhã a cortina se fecha e o dia acorda quarta-feira de cinzas.

quinta-feira, dezembro 09, 2010


Amarelinha


Como quem segura as continhas do terço rosinha com fé, ela prende a pedrinha entre os dedos e joga na casa 4. Mentalizando para que tudo dê certo e que ela não tenha que passar sua vez. Assim como quem perde uma oportunidade na vida, assim como quando você é o próximo da fila imensa e você esqueceu de algo em casa, assim como quem precisa enfrentar a vida tirando um coelho todo santo dia da cartola, assim como quem sacode a poeira e continua a caminhar, assim como quando você cai da bicicleta sem rodinha de apoio, rala o joelho e o papai dá toda a força necessária pra continuar a aprender.

Não que eu queira incentivá-la a perder e caso ela não acerte a pedrinha tudo bem, mas não há necessidade de ser sempre superfantástico. É preciso saber viver, saber ganhar e principalmente saber perder. É preciso saber ser feliz diante da torta de morango cremosa com calda de chocolate, da salada de chuchu e do prêmio recorde da loteria.

Independente se o prêmio seja o céu escrito em caligrafia ilegível do outro lado da amarelinha, ser escolhida primeiro na divisão dos times ou as barras de ouro que valem mais do que dinheiro, se não chover a gente vai pra rua brincar de pega-pega e se chover a gente vai também, só pra sentir os pinguinhos que caem nas nossas cabeças e molham os cabelos, e pra chutar as poças que se formam nos buraquinhos do asfalto que nos impossibilita de andar de patins nas férias.

E se a gente vivesse o resto dos nossos dias como se fossem eternos recreios? Não haveria sinal de entrar para classe, nem inspetora gritando para aproveitar os últimos cinco minutos, nós não seriamos tão mais alegres? Imagine se a gente pudesse viver feito propaganda de coca-cola, a cada gole uma sensação nova, um arco-íris na palma da mão, abrir sorrisos no rosto de alguém e com isso a felicidade, sem precisar comprar garrafas e mais garrafas de refrescância.

E se a gente passasse todo o tempo desse recreio jogando. Jogando conversas fora, risadas sem fim, olhares pela janela, bolinha de gude, botões com o titio, porque jogar por jogar não vale, só vale jogar e não se jogar, jogar por diversão. Por pura diversão, igual quando a gente vai à montanha- russa, e quer ser o primeiro do carrinho, e a sensação de sentar no meio ou em último é a mesma, assim quando estamos na roda gigante ou no carrossel.

O craque da pelada entre amigos, não será o vencedor de xadrez. Quem faz xeque-mate ganha a partida e não a melhor de 5. Quer saber, nem sempre o melhor do jogo é o melhor na vida.

E ela leva o braço lentamente para trás como um pêndulo e lança a pedrinha.

terça-feira, dezembro 07, 2010


Onde o mundo faz de conta


'Fantasias como vês, não faltam'
Caio F.


Em tempos como esses, a menina descalça dos olhos semente de romã, sorriso estampado, saia rodada e barra rasgada, remendada das mais coloridas linhas de esperança, precisa inventar outros caminhos, outras invenções, outras vidas para fugir um pouco dessa.

Caneta bic em mãos, uma história fantástica na cabeça, tintas e papéis são suficientes para viajar para caminhos dourados, brilhantes e iluminados que levem-na para o mundo das lantejoulas que choram alegrias pinga-pinga dentro dos olhos de quem vê.

Você pode até dizer que ela vive no mundo da lua, ela pouco vai se importar, vai sorrir mansinho e dar de ombros com carinho, e continuará desgrudando seus pés pequeninos, diariamente, do chão de imã, pontiagudo e seco, passando os dias inventando faz de conta que ela cruza os dedos com força pra que aconteça de verdade.

Lá onde ela se esconde o azul é mais azul e o céu é de brigadeiro. As cores da noite são mais intensas, pinceladas com a aquarela cintilante que torna o sonho real e as estrelas têm um brilho incomum. Ela arranha um sol no violão e deita na grama pra observar as borboletas que também povoam seu estômago num movimento de girar intenso que ela precisa pra viver.

Os pés descalços, sempre, é pra sentir melhor o chão, tatear espinhos perdidos, o caminho florido, a liberdade. Liberdade em escolher a areia, a lama, a casca de banana e o caco de vidro. Caminhos diversos que ela vai alterando de acordo com seu astral de menina que acredita que a magia não acaba quando a mágica termina e a pomba voa em direção ao infinito.

...
E adormece sobre o papel da história que inventou lançando-a para seu sonho, dando vida às suas ilusões, afinal ela só dorme pra continuar sonhando.

quarta-feira, dezembro 01, 2010


E agora Ana?

'Uma vez, quando eu tinha quatro anos, achei um caco de vidro no monturo. Lavei, enxuguei, guardei bem guardado e fui comer com vontade, ficar obediente, emprestar minhas coisas, por causa do caco, porque tinha ele, porque eu podia quando quisesse pôr ele contra o sol e aproveitar seu reflexo'
Adélia Prado



Segura na ponta de uma estrela e vai. Voa. Desenha um sol, algumas nuvens, diversas estrelas brilhantes e uma flor bem bonita desabrochando ali no meio do asfalto.

Voa e acredita que com a aquarela a gente pode construir tudo. Tudo. Desde um planeta dourado até um castelo com linhas bordadas de cristal. Empresta a asa da borboleta e alcança a pontinha do arco-íris. Aproveite, descobre e revele o pote da felicidade que fica ali. Ali, bem do outro lado, logo atrás da montanha, um pote de pó mágico, repleto de moedas reluzentes.

Lambuze a boca de sorvete e os dedos de algodão doce. Pule amarelinha, se divirta no uni duni, pega ladrão e esconde-esconde. Corre ao vento, grite bem alto, chute a poça d’água e brinque embaixo do chuvisco da chuva. Acredite que para o sorriso largo é necessário apenas olhos grandes para as coisas pequenas.

Vê se entende Ana, de uma vez por todas, que em um dia qualquer, por um motivo qualquer, independente do que for, as lágrimas sempre chegarão e molharão seus olhos de jabuticaba madura, mas não se preocupe, voe que isso passa. Deixe pra trás tudo o que não tem cor e você verá o encanto das coisas simples.

Não ache isso estranho. Pode ser que essas lágrimas doces ou salgadas sejam apenas o céu tirando a maquiagem, a doçura das nuvens de algodão feitas de açúcar ou o mar que você tem dentro do peito e que escorrem vez ou outra, pelos seus olhos.

Não se preocupe e nem ouse desistir, você vai ver que um dia os brinquedos que hoje movidos à sentimentos fracos, sem pilhas e sem emoções um dia pararam e só o que tem força continuará sempre em frente.

Calma, as estrelas que não se acenderam, só estão esperando o momento oportuno para brilharem e o mundo, enfim, não descolorirá, acredite.
Agora Ana, feche os olhos, conte carneirinhos, ‘para o infinito e além’, sonhe com o giro do compasso e com aquela astronave muito mais colorida que tentamos pilotar. Sonhe com o céu, pois sua vontade vai muito além do chão.


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