Um fotografo confinado em seu apartamento, com uma perna engessada, sem nada pra fazer, decide bisbilhotar a vida alheia como forma de matar seu tempo. Seria novidade se não se tratasse da trama de
Janela Indiscreta, do mestre do suspense,
Alfred Hitchcock, inspirado no conto de
Cornell Woolrich. O filme trata com maestria o
voyeurismo, algo que eu, você, nem ninguém pratica.
Vamos supor que alguém, assim, muito longe da gente, em um universo bem distante, comente da vida do artista da televisão, do conhecido da cidade, do parente ou do vizinho. Essa gente existe, mas a gente não sabe muito bem onde fica, não é mesmo? Sabe aquele programa de tv que todo mundo fala que não vê, e se sabe alguma coisa é porque estava mudando de canal? Isso mesmo, o tal do
Big Brother,
A Fazenda, daquele site especialista em propagar a vida pessoal do seu artista favorito, ou da revista de celebridade, então, por que será que fazem tanto sucesso? Será que as pessoas têm curiosidade em saber da vida alheia e acabam por inventarem histórias supondo alguma coisa? Não, né, devo estar enganada.
Ana é vizinha de um hotel, um não, vários. É moradora do bairro que mais recebe viajantes na cidade. São cerca de 4 hotéis nas redondezas da sua casa. Mas tem um especificamente, que fica na esquina. A rotina de lá interfere na rotina de cá, não diretamente mas interfere nas conversas da família de Ana, todo dia.
Tem o rapaz que mora no hotel, e sempre que ele está por lá a janela do segundo andar está aberta e a luz acesa. Ah, sem contar que ele, mesmo que Ana não conheça sua história de vida, considera-o como um vizinho antigo, com tchauzinho ele acena para Ana e sua familia. Ultimamente o quarto dele não anda com a janela e a luz acesa, pode ser que ele tenha mudado, foi a conclusão que chegaram. Tem o final de semana de festa na cidade que o hotel está com todos seus quartos ocupados e tem sempre algum hospede que sai na sacada pra conversar. Tem a galera do
instagram que gosta compartilhar com os amigos os arredores do hotel hospedado. Tem semana que todas as luzes dos quartos estão apagadas, ou seja, nenhum hospede. Enfim, é animada a vizinhança por lá, cada dia um novo vizinho.
Ana faz caminhadas diárias na esteira da sua casa, que lhe proporciona uma visão privilegiada da rua, consequentemente quem entra no hotel. Uma caminhonete dessas do ano corrente, com vidros escuros, havia estacionando do outro lado da rua, em frente sua casa.
Embora os vidros fossem escuros era possível notar que 2 pessoas ocupavam o veículo. Ana caminhava e o carro continuava ali, parado, ninguém descia. Isso a intrigou. 3, 5, 10, 15 minutos parados, deu partida, o carro virou na esquina e voltou para o mesmo lugar.
Ah não, Ana ficou ainda mais curiosa. Cerca de três minutos depois, o motorista desce e caminha em direção ao hotel, deixando a carona dentro do carro.
Ana caminhava e se questionava sobre as mil e uma possibilidades. Afinal quando você faz esteira e não tem tv, é necessário encontrar diversas coisas pra pensar. Ana estava pronta para a qualquer momento dos próximos segundos desvendar o mistério.
Será que Ana é a única a criar histórias que poderiam acontecer, mesmo que elas não saiam da sua cabeça? Acontecem romances, tragédias, comédias e dramas sobre fatos corriqueiros que acontecem diante dos meus, dos seus, dos nossos olhos. Fico imaginando o que as pessoas pensam ao se depararem com cenas, mesmo que não sejam extravagantes ou fora da realidade, protagonizadas por mim ou por você ao caminhar pelas ruas. Gosto de me colocar no olhar do outro, mesmo que isso me ajude apenas a criar histórias.
Eu sei que eu, nem você, nem ninguém fala da vida alheia. Mas vai me falar que você não dá uma só uma espinhadinha. Só sei dessa história porque a Ana me contou.
Ana não sabe o desfecho do caso, embora tenha criado uma porção de finais possíveis.